Nos capítulos anteriores, depois de
obtermos uma visão geral da verdade acerca da
Igreja, consideramos um aspecto especial
dela – a Casa de Deus. Há, contudo, outro
aspecto importante no qual a Igreja é
apresentada na Escritura, a saber, como o Corpo de
Cristo. É isso que agora podemos considerar
resumidamente.
Em relação a esse aspecto da Igreja, a
linguagem da Escritura é muito precisa.
Lemos em Colossenses 1:18, que Cristo “é a
Cabeça do Corpo, a Igreja”, e novamente em 1
Coríntios 12:12 e 13, “assim como o Corpo é
um, e tem muitos membros, e todos os
membros do Corpo sendo muitos, são um só
Corpo, assim é Cristo também. Pois todos nós
fomos batizados em um Espírito formando um
Corpo, quer judeus quer gregos, quer servos
quer livres, e todos temos bebido de um
Espírito”. Dessa Escritura está claro que todos os
crentes são formados em um Corpo pelo
Espírito Santo na terra com uma Cabeça no Céu.
Vimos que os homens foram iniciados pelo
batismo com a água na profissão cristã que
forma a Casa de Deus na terra. É claro,
contudo, que nenhum batismo por água pode
conduzir as pessoas ao Corpo de Cristo.
Isto só pode ser efetuado pelo batismo do Espírito
Santo. Assim apenas o que é verdadeiro pode
ter alguma parte no Corpo de Cristo. Ao
pensarmos no Corpo de Cristo, devemos olhar
para os cristãos apenas à luz da obra de Deus
neles. É verdade que a carne ainda está em
nós, mas Deus a condenou, e vendo-nos à parte
dela, nos vê “em Cristo” e “no Espírito.”
Isto é, Deus sempre vê o Seu povo com relação a
Cristo e ao Espírito, e somos privilegiados
por nos vermos do mesmo modo. Alguém disse:
“É somente nessa luz que podemos falar da
qualidade de membro do Corpo; nada encontra
de alguma forma lugar no Corpo de Cristo
além do que é de Cristo – de Deus. Não há como
imaginar tais coisas como fracasso ou carne
no Corpo de Cristo”. Aqueles que compõem o
Corpo, tendo a carne neles, podem de fato
falhar em conseguir andar na correspondência
com a verdade, mas no próprio Corpo tudo é
de Cristo. É o Seu Corpo.
Há três porções da Escritura que, de um
modo especial, apresentam essa grande
verdade: Efésios l e 2; Colossenses 1 e 3;
e 1 Coríntios 12 e 14. Em Efésios o Corpo é
apresentado em seu aspecto eterno segundo
os conselhos do Pai. Em Colossenses é
examinado em seu aspecto temporal como o
vaso para a exposição de Cristo. Em 1
Coríntios o Corpo é apresentado como o
instrumento para as manifestações do Espírito na
terra.
As manifestações do Espírito através do
Corpo têm em vista a exibição de Cristo
pelo Corpo no tempo; e a exibição de Cristo
agora é apenas o prelúdio da aparição posterior
de Cristo em Sua plenitude nas eras
vindouras segundo os conselhos do Pai.
Primeiro,
então, podemos considerar a verdade do Corpo segundo os conselhos do
Pai. Em Efésios 1 o grande objetivo é o
propósito do Pai para a glória de Cristo. O capítulo
revela “o mistério da Sua vontade, segundo
o Seu beneplácito, que propusera em Si mesmo,
de tornar a congregar em Cristo todas as
coisas, na dispensação da plenitude dos tempos”
(versos 9 e 10). Além disso, nesses
conselhos a Igreja tem um lugar do mais alto privilégio
em relação à glória de Cristo, e por essa
razão nós também somos informados sobre o
futuro destino da Igreja como o Corpo de
Cristo. Aqui a Igreja é vista, não em relação ao
tempo presente, mas em relação à “plenitude
de tempos”. Nos é permitido olhar para além
do momento presente, com todo o seu
fracasso, e ver a glória futura da Igreja como o
Corpo de Cristo. Naquele dia “a Igreja que
é o Seu Corpo” será “a plenitude Daquele que
cumpre tudo em todos” (versos 22 e 23).
Segundo o conselho de Deus, o dia está chegando
quando Cristo encherá todas as coisas. Todo
o universo será cheio de bênção através de
Cristo, mas, naquele dia, será o privilégio
especial da Igreja expressar “a plenitude Daquele
que cumpre tudo em todos”. Embora tudo seja
abençoado por Cristo, e seja a glória de
Cristo, ainda assim tudo não expressará a
Sua plenitude. Isso será reservado para a Igreja.
Um santo individual pode exibir algum traço
de Cristo, todas as coisas no mundo vindouro
exporão Cristo em grande medida, mas
somente na Igreja como o Corpo de Cristo estará a
exibição perfeita de Cristo em toda a Sua
plenitude. A plenitude transmite o pensado de
perfeição. Assim, não será apenas a
exibição de Cristo, mas será a exibição em perfeição.
Isto é, não apenas toda a excelência de
Cristo será vista, mas tudo será visto na proporção
correta. Nenhum traço predominará; todos
serão exibidos em perfeita proporção e relação
de uns com os outros do mesmo modo que os
membros de um corpo humano normal estão
todos em proporção e expressão da
mentalidade da cabeça. Mas o que será de fato
verdadeiro então deveria ser moralmente
verdadeiro agora.
Isso leva à verdade do Corpo como o vaso
para a exibição de Cristo no tempo.
Para este aspecto da Igreja como o Corpo de
Cristo, devemos então voltar à epístola aos
Colossenses. O grande objeto dessa epístola
é o de revelar o esplendor de Cristo como o
Cabeça. Lemos em Colossenses 1:18: “Ele é a
Cabeça do Corpo, da igreja” É, além disso,
o desejo de Deus que a glória moral do
Cabeça no céu tenha uma exibição presente através
do Corpo na terra. Por essa razão o
apóstolo, tendo falado do ministério do Evangelho,
prossegue para falar de um segundo
ministério em relação ao Corpo de Cristo “que é a
Igreja” (verso 24). Ele fala dessa verdade
como “o mistério que esteve oculto desde todos
os séculos, em todas as gerações, e que
agora foi manifesto aos Seus santos”. Além disso,
ele fala da glória desse mistério como
sendo “Cristo em vós, a esperança da glória”.
O apóstolo coloca ênfase especial nesses
dois grandes fatos. Primeiro, o
determinado momento quando o mistério é
revelado, e segundo, a glória especial desse
mistério no tempo presente. Esses dois
grandes fatos têm ligação direta um com o outro.
Por que, podemos perguntar, o mistério é
tornado conhecido “agora”, e não antes? Porque
três grandes eventos tiveram que vir sem os
quais a Igreja não poderia existir de fato ou se
tornar conhecida como uma verdade. Cristo
tinha que ser exaltado como o Cabeça glorioso
no céu, o Espírito Santo tinha que vir à
terra, e por fim, Cristo tinha que ser finalmente
rejeitado pelos judeus.
Os dois primeiros eventos foram
absolutamente necessários antes que a Igreja
pudesse ser formada. Deve haver o Cabeça no
Céu antes que possa haver Corpo na terra, e
o Espírito Santo deve vir para viver nos
membros e assim transformá-los em um Corpo na
terra com um Cabeça no Céu. Mas o Corpo
existia como um fato antes que a verdade fosse
tornada conhecida. Por isso o terceiro
grande evento foi necessário. Se a verdade de judeus
e gentios sendo formados em um Corpo
tivesse sido revelada antes de Cristo ser rejeitado,
ela teria contrariado todas as promessas
expressas de Deus aos judeus sob a primeira
aliança. Mas quando os judeus finalmente
rejeitaram a Cristo, a primeira aliança chegou
definitivamente ao fim, e o caminho está
preparado para revelar a verdade da Igreja como o
Corpo de Cristo. A rejeição foi final e
completa quando Estevão foi apedrejado. Pela cruz o
homem tinha rejeitado a Cristo na terra, e
pelo martírio de Estevão eles rejeitaram a Cristo
no Céu. Eles apedrejaram o homem que
testemunhou o fato de que Cristo está no céu.
Assim chegou o momento para revelar o
grande segredo que, embora o próprio Cristo tenha
sido rejeitado, o Seu Corpo está na terra.
Preste atenção, não que os pecadores salvos pela
graça estarão no Céu – esse é o Evangelho e
não há nenhum mistério nele; o ladrão que foi
crucificado sabia disso – mas o segredo é
agora revelado que Cristo tem a Igreja – o Seu
Corpo – no lugar da Sua rejeição durante o
tempo da Sua rejeição. A primeira notificação
dessa grande verdade é dada em relação à
conversão do homem que foi feito o ministro
dessa verdade. O Senhor disse a Saulo:
“Saulo, Saulo, por que Me persegues?” Não é: “Por
que você persegue os Meus discípulos”, ou
“os que me pertencem”, ou “aqueles que são
parte de Mim”, mas “Por que ME persegues?”
Como alguém disse: “Naquelas poucas
palavras está comunicado o fato de que
Cristo está aqui”.
Além disso, se Cristo está aqui naqueles
que formam o Seu Corpo, é porque Cristo
pode ser exibido pelo Seu Corpo. E Cristo
exibido na Igreja hoje é “a esperança da glória”.
Na glória, como vimos na epístola aos
Efésios, Cristo será exibido em Sua plenitude. Mas a
esperança da glória deve ter um cumprimento
presente. Por essa razão o apóstolo prossegue
para mostrar como Cristo nos santos deve
resultar na exibição de Cristo pelos santos.
Assim o pensamento presente de Deus para o
Corpo – composto de todos os santos em
qualquer dado momento na terra – é que
nisso deve haver o estabelecimento de Cristo
moralmente, e assim o Corpo na terra
corresponda ao Cabeça no céu.
No segundo capítulo de Colossenses o
apóstolo mostra como Deus operou para
fazer isto acontecer e nos adverte dos
diferentes dispositivos pelos quais o diabo procura
frustrar o propósito presente de Deus nos
santos. Primeiro somos advertidos contra as
opiniões enganadoras dos homens,
apresentadas de forma muito atraente pelo discurso
persuasivo (verso 4); então a filosofia, ou
o amor pela sabedoria humana tirada das
tradições dos homens e dos elementos do
mundo (verso 8); além disso, somos advertidos
contra a religiosidade da carne, ligada a
abstinência de certa comida e a observância de
certos dias (verso 16); finalmente somos
advertidos contra a superstição, como o culto a
anjos (verso 18).
Se devemos exibir as belezas morais de
Cristo, temos que conhecer a Cristo.
Temos que conhecer Aquele cujo caráter
devemos expor. As opiniões dos homens, a
filosofia do homem, a religião carnal, e as
superstições dos homens não nos ensinarão nada
do caráter de Cristo nem nos habilitarão a
expormos aquele caráter quando conhecido.
Depois que somos advertidos acerca dos
laços do inimigo, somos instruídos
quanto à provisão que Deus fez para que a
perfeição moral do Cabeça possa ser exibida no
Corpo. Em conexão com isso quatro grandes
verdades são estabelecidas:
Estamos “perfeitos Nele” (verso 10).
Estamos identificados com Ele (versos 11 a
13).
Somos Dele: “o Corpo é de Cristo” (verso
17).
Obtemos toda a nutrição espiritual Dele
(verso 19).
1. Estamos “perfeitos Nele”. Nele habita
toda a plenitude da Divindade; por isso,
tudo o que possivelmente podemos precisar
para que possamos conhecer a Cristo e exibir a
Cristo é encontrado Nele – estamos
completos Nele. Estamos completamente
independentes do homem como homem. As suas
opiniões, a sua filosofia, e a sua religião
não podem nos conduzir a Cristo não podem
revelar o Seu caráter, ou nos habilitar a expor
as Suas belezas morais.
2. Estamos identificados com Ele. “Na cruz,
no sepultamento, na ressurreição, e na
vida, Deus identificou o crente com Cristo.
Na cruz – anunciada pela circuncisão – Cristo
verdadeiramente morreu para tudo o que é da
carne; no sepultamento Ele verdadeiramente
ficou longe da vista; na ressurreição Ele
verdadeiramente ficou para sempre fora do
domínio da morte; e como vivificado Ele
passou para uma cena de glória em uma vida e
condição que é inteiramente ajustada à
glória de Deus. Agora o que é realmente verdadeiro
para Cristo é verdadeiro para os santos na
visão de Deus que nos identifica “com Ele,” e a
fé vê com Deus. Sabemos que a nossa carne
foi morta em Cristo; e não foi apenas morta,
mas ficou longe da vista, pois fomos
“sepultados com Ele no batismo”. Além disso, no
espírito fomos ressuscitados com Ele, para
que a morte perca o seu poder sobre nós. E
embora os nossos corpos mortais ainda não
estejam vivificados, quanto às nossas almas,
vivemos para Deus naquela vida celestial
mostrada em Cristo.
3. Estamos às Suas ordens – “o corpo é de
Cristo”. As ordenanças da lei foram
apenas sombras e foram dadas ao primeiro
homem que é da terra, terreno. Mas as coisas
vindouras, das quais as ordenanças eram
apenas a sombra, são de Cristo, o Homem
celestial. E se Cristo é celestial, o Corpo
que é de Cristo também é celestial. “Qual o
celestial, tais também os celestiais”. Por
enquanto estamos na terra, mas somos do Homem
celestial, e por essa razão pertencemos ao
céu.
4. Conseguimos toda a nutrição do Cabeça.
Se a Igreja é celestial, só pode ser
nutrida pelo céu. Não há nada da terra que
possa servir ao homem do céu. Não há nada do
homem como tal que possa servir de nutrição
para o Corpo, ligar os membros juntos, ou
conduzir ao incremento espiritual. Tudo
deve vir do Cabeça no céu, ministrado ao Corpo
pelas juntas e ligaduras do Corpo. Como o
Cabeça no céu é para a nutrição do Corpo na
terra, assim o Corpo na terra é para a
exibição do Cabeça no céu. Por não mantermos o
Cabeça, podemos falhar em mostrar o Cabeça,
mas Cristo – o Cabeça – nunca falhará em
nutrir o Seu Corpo; Ele tem cuidado com o
Corpo e com cada membro do Corpo.
Esses quatro grandes fatos – de que somos
“completos Nele”, de que estamos
identificados “com Ele”, somos Dele, e
conseguimos toda a nutrição Dele – todos eles nos
levam ao cumprimento do propósito presente
de Deus para o Corpo, a saber, a
demonstração do caráter do Cabeça no Corpo.
Isso é visto de um modo prático nas
exortações seguintes.
Baseado no que é da Igreja nos dois
primeiros capítulos, somos exortados a nos
“revestirmos pois, como eleitos de Deus,
santos, e amados, de entranhas de misericórdia, de
benignidade, humildade, mansidão,
longanimidade; suportando-vos uns aos outros, e
perdoando-vos uns aos outros, se algum
tiver queixa contra outro; assim como Cristo vos
perdoou, assim fazei vós também. E sobre
tudo isto, revesti-vos de amor, que é o vínculo da
perfeição. E a paz de Deus, para a qual
também fostes chamados em um corpo, domine em
vossos corações, e sede agradecidos”
(Colossenses 3:12-15). Esse é o caráter amoroso de
Cristo, marcado pela graça com o seu perdão
ilimitado, pelo amor que agrega todas as
outras perfeições juntas, e pela paz
governando o coração, as quais os santos, na unidade de
“um Corpo”, são chamados para exibir
enquanto ainda na cena da ausência de Cristo e
esperando pelo dia da Sua aparição.
Que bela apresentação de Cristo seria se os
santos, como “um Corpo”, fossem
marcados pela graça, pelo amor e pela paz.
Embora em um dia de ruína em nossas práticas
que estão distantes deste belo quadro, não
abaixemos o padrão. Alguém verdadeiramente
disse: “Mesmo se a prática não puder chegar
a isso, e mesmo se for impossível conduzir os
santos ao verdadeiro padrão, vamos ter a
idéia correta. É uma grande coisa ter a idéia
correta; mas então se a temos, vamos
esperar que o Senhor dê graça para andar segundo a
idéia correta, em sua verdade, muito embora
você não possa esperar ver as coisas
restauradas ao que elas foram quando
primeiramente estabelecidas”.
Por HAMILTO SMITH.
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